sexta-feira, 29 de junho de 2012
O Pato Fáustico - O amor nos tempos do blog, de Vinicius Campos
Neste videocast do Pato Fáustico apresentamos o romance "O amor nos tempos do blog", de Vinicius Campos. A estrutura do romance inova ao mesclar a linguagem do blog com o gênero romanesco. Confira!!!
domingo, 24 de junho de 2012
O Pato Fáustico - Guia de ruas sem saída, de Joca Reiners Terron
O Pato Fáustico hoje fala da nova ficção de Joca Reiners Terron, Guia de ruas sem saída: um híbrido entre o romance e a história em quadrinhos.
E aí, que tal? Participe, comente, discuta!!!
O Pato agradece, desde já!
Um livro sem guia, sem saída

O livro conta a história de
dois personagens: uma cara que tá perdendo seus órgãos e não sabe bem porquê; e
outro que faz uma longa viagem pro outro lado do mundo pra receber um
transplante de fígado. E esse outro que tá perdendo os órgãos ele é, ou pensa
que foi, ou desejaria ter sido, isso não fica muito claro, um desenhista de
história em quadrinhos, um cartunista, o criador, um criador de grande sucesso,
do Homem-escada, que é um personagem...que é um...é um...é um super-herói meio
patético porque né, afinal de contas ele só tem um superpoder que é justamente
auxiliar as pessoas a chegar a um outro lugar.**
Acima, o
autor Joca Reiners Terron tentando definir a mistura de história em quadrinhos,
literatura, e órgãos perdidos que constituem seu mais novo trabalho, Guia de ruas sem saída. Como fica
explícito, qualquer tentativa de compreender inteiramente sua história esbarra
em um exercício superficial quase inútil, visto que são muitas as
possibilidades de associações entre os estratos do enredo. Não é à toa que
Terron gagueja e titubeia logo após tentar definir a “trama básica” de seu
livro, assim como não pode passar em branco que o magnífico “Homem-escada”
esteja ausente na primeira sinopse.
O texto é
construído com a parceria do desenhista André Ducci, cujas imagens complementam
a trama da ficção. Logo em seu início, somos levados ao tom imaginativo e
autorreferente dos contos de fadas a partir do “Era uma vez”, usado com precisa
ironia. A prosa tateia as próprias possibilidades assumindo seu hermetismo:
“Era uma vez.
E fim.
Queria
começar a história dessa maneira. Era uma vez. E fim. Mas não. Existem outras
coisas entre esses dois extremos.
Por exemplo:
mãos.” (7)
Entre o
começo e o fim, o pesadelo do aleatório e do acidental ronda a configuração de
uma estética híbrida. Ambivalência que influencia a perda das identidades das
personagens, visto que elas sucumbem até mesmo à confusão das pessoas do
discurso:
Ou quando as
próprias palavras perdem a identidade, ao misturarem-se umas com as outras:
“Que catso de
gelo é esse que me queima a pele? Que porra de água gelada é essa? Que
puta-que-pariu de lugar branco é este? Meus pensamentos tão embaralhando, tão
pensalhando, tão embamento. Que catlo de gezo é esmi pe queima ssenha quele?
Gue ágorra de pgua quelassa é eda? Seum mentolhando, não pensaemba. Pue
luta-que-pfiu de pusanco garepo, catso, orraralho? Que puta-que´pariu de lugar
branco é este, porra caralho? (p. 17)
O signo
transracional é mais uma forma de enfatizar as áreas semânticas além do campo
lexical conhecido. Assim, após a primeira sequência de imagens (que dura 54
páginas), somos surpreendidos com uma única frase solta no meio da página 76:
“Acho que comecei a entender tudo”. Não sabemos qual o limite da memória das
personagens. Não sabemos onde termina o “era uma vez” e começa o “foi mesmo
assim”, pois o tema central de Guia de
ruas sem saída envolve justamente a imprevisível abertura da forma. O
romance aceita a história em quadrinhos como potência regeneradora, no sentido
de que se renova enquanto gênero ao demonstrar que nada sabíamos a respeito de
suas reais potencialidades. Na linha de outros brasileiros, como Ferréz, em Capão Pecado, ou estrangeiros como
Sebald em Austerlitz, entre outros, as
imagens revitalizam e estendem os limites da gramática romanesca, mesmo que
descaracterize o repertório canônico que conhecíamos.
André Ducci
mostra uma sensibilidade afinada com seu companheiro escritor. Com destaque
para o uso de preto e branco que, em cenas como a do mendigo, por exemplo, e no
tratamento dos olhos (inteiramente negros, ou brancos) ajudam a
compor o interior dos seres. Além disso, o traço do desenhista enfatiza as
formas geométricas, que são respeitadas dentro da anatomia das personagens e na
composição dos quadros, como o brilho do mar composto por retângulos pretos e
brancos, lembrando Picasso, e cenas como a do incêndio - além dos tons de cinza
que não pude deixar de relacionar a Guernica, pois a ausência de cores aqui
também contribui para isolar os valores da forma e a tragicidade do tema. Em
muitos momentos, as sombras e formas permitem também certa dualidade entre o
profundo e o plano, principalmente nas cenas da esposa sozinha no hospital.
Guia de ruas sem saída é um projeto
ousado de ficção que permite mais uma vez admitirmos o quão insuficientes
sempre serão as previsões do futuro da arte. Quando menos esperávamos ela nos
desestabiliza mais uma vez e mostra que vive numa temporalidade em que a fruição
não é ainda suficiente para capturar. Um livro sem guia nem saída? Talvez. Mas,
com o mesmo super-poder de seu emblemático herói, pode nos permitir o acesso a outro
lugar.
TERRON, Joca Reiners. Guia de ruas sem saída. São Paulo:
Edith, 2011.
* Entrevista disponibilizada no endereço http://televisao.uol.com.br/videos/assistir.htm?video=metropolis--entrevista-com-o-escritor-joca-reiners-terron-04020D9B366EE0B92326
** Entrevista disponibilizada no
endereço
http://globotv.globo.com/globo-news/globo-news-literatura/t/programa-completo/v/achei-que-o-livro-fosse-ser-tradicional-mas-virou-uma-montagem-diz-escritor/1933965/
Daniel Baz dos Santos
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